Todo
lugar tem seus habitantes pitorescos e São José do Jacuípe não faria aos tais a
desfeita de não tê-los. Pois bem. Há por aqui um senhor que não goza de
perfeito juízo, e não sei por qual razão, ele é conhecido pela alcunha de
China. Eu jamais procurei saber seu nome de batizado para não perder a magia de
tudo e contento-me com seu nome de guerra, pois de guerra ele deve entender
muito bem.
Não
há em meu poder informações que datem o período, mas, por informações que me
foram passadas por familiares, sei que o vulgo serviu nas fileiras do Exército
Brasileiro na cidade do Rio de Janeiro. E após algum problema que lhe revirou a
cabeça, China veio embora a pé para sua terra natal, São José do Jacuípe. Uma
de suas irmãs – que foi minha professora – disse-me certa vez que ele chegou
munido de vasta cabeleira e avolumada barba, assim no feitio de profeta
amalgamado com Machado de Assis.
Entre
seus hábitos peculiares estava o de subir em bancos e canteiros de praças para
fazer discursos inflamados sobre guerras, conspirações e ataques ao governo.
Assisti a muitas dessas declamações em meus anos adolescentes. Mas deixemos de
tanto introito para enfim penetrar os umbrais de nossa história, que digo assim
de passagem, fosse algo sério, teria feito com que o nobre China e este
simplório escritor tivessem entrado para os anais da história brasileira com
direito a feriado em nossa homenagem.
Corria
o ano de 2004, eu havia tentado montar uma escola de informática, e um dia, em
meu humilde e minimalista escritório dedicava tempo vadio ao expediente de
jogos digitais. Então, surge a figura inconfundível de China e após bater
continência para mim, senta-se ao meu lado e começa a citar uma lista de
patentes e comandantes seguidos de códigos militares do tipo “Tango”, “Bravo” e
outros.
-
Eu sei o que você está fazendo ai – disse-me apontando para a tela do
computador – Você está rastreando.
Fiquei
um pouco perturbado no momento, pois não sabia o que fazer para lidar com
aquela conversa onde eu só estava ouvindo. Foi aí que ele sacou um pedaço de
papel pautado e me entregou. Ali estava escrito uma série de números e aquelas
enormes siglas militares. Depois de um minuto observando o papel, recebi do
distinto um pedido:
-
Rastreie isso aí, por favor.
Resolvi
entrar na onda dele. Coloquei o papel sobre o teclado e abri o bloco de notas.
Digitei sequencias numéricas misturadas a letras, fechei e abri janelas, abri
imagens, arquivos, fiz aparecer barras de processamento tendo sempre uma
expressão grave no rosto. Depois de cinco minutos nessa tarefa, passei-lhe o
papel.
-
Pronto!
-
Missão cumprida? – quis saber ele.
-
Missão cumprida.
China
levantou-se me olhando estoicamente, bateu continência e saiu após dizer:
-
Salvamos a pátria!
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