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Valdeck no projeto ArtPoesia |
O Cuscuzeiro entrevistou o
poeta Valdeck Almeida de Jesus,
natural de Jequié – BA. Funcionário Público, jornalista, promove e custeia
todos os anos o prêmio que leva seu nome e revela novos poetas em todo o Brasil
e partes do mundo. Com cerca de 15 livros publicados e inúmeras participações
em antologias, Valdeck é uma voz a ser ouvida na arte da Bahia.
Com esta, o Cuscuzeiro inicia uma série de conversas com poetas baianos.
Entrevistas que negam o convencional e focam em reflexões profundas do cotidiano,
do trivial e do fantástico.
Cuscuzeiro - Valdeck,
o que o mar significa para você?
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Com a Produtora Cultural Viviane Vergasta Ramos e o ator Lázaro Ramos |
Valdeck - O mar pra mim
é a terra dos peixes, como descrevi num poema que ganhou uma premiação no
programa Aprovado. É a estrada de água que liga as nações. Fonte de inspiração
e de vida. Dele nasce nosso alimento, parte do ar que respiramos. É ele que
controla a temperatura do planeta. O mar pra mim é uma mãe. Deveria ser chamada
A-MAR, porque sem a-mar ninguém pode viver.
Água salgada, como o sangue de nosso corpo, o mar é o cérebro da Terra,
o pulmão do mundo, o intestino, o estômago. O mar é tudo. E muito mais o homem
vai descobrir sobre e sob o mar.
Cuscuzeiro -Sua forma de acreditar (ou não) no amor.
Valdeck - Amor é desprendimento. O amor
contratado, seja de um garoto ou uma garota de programa, é um amor limitado. O
amor de marido e mulher que sobre(vivem) por causa da dependência financeira,
presos por outro contrato, o casamento, não me atrai em nada.
Já vivi alguns amores: minha mãe, que faleceu em
2000. Meus irmãos e irmãs, bem como sobrinhos e outros parentes desfrutam do
meu amor, mesmo não revelado, denunciado. Quem ama não precisa nem dizer ao
outro(a) sobre o sentimento. Quando se diz, já começa uma dependência ou a
espera de uma aprovação, um reconhecimento; se se ama em silêncio, como o faz o
universo em relação a nós, aí, sim, se revela o verdadeiro amor: aquele que não
pede nada em troca.
Tem o amor da atração sexual, a dependência carnal,
a atração animal e nem sempre controlável. Esse é um amor fugaz, dura enquanto
dura, como disse o poeta.
Cuscuzeiro - O que é o sofrimento?
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Na bienal do Livro 2011 |
Valdeck - Sofrimento é não ter o que se
deseja. Depois que se tem o que deseja, o sofrimento é outro. Sempre uma
utopia, um desejo não realizado ou o medo de perder a realização para um ladrão
de desejos. A vida humana é um sofrimento constante. Parafraseando Jorge Mautner,
a vida é uma agonia interminável. Sofremos pelo frio, pelo calor, pela poeira,
pela fome, pela barriga cheia, pelo desemprego, pelo emprego, se estamos a pé
ou de carro, sofremos por ser brasileiros ou porque não somos brasileiros.
Sofrimento é o que movimenta a vida. Sem essa agonia, todos seríamos
dinossauros e morreríamos no primeiro choque de meteoro.
Cuscuzeiro - O melhor lugar para estar?
Valdeck - Atualmente, com tanta
violência, é minha casa, trancada com grades. Eu não sofreria muito se fosse
condenado a passar a vida numa prisão. Já vivo em uma faz muitos anos. Trabalho
quase forçado, todos os dias tenho que sair da prisão e ir trabalhar. Sou
vigiado por câmeras que registram minha chegada, permanência, saída e até quando
entro e saio do sanitário. Não sou mais espontâneo. Todos os meus passos são de
um ator: movimentos cadenciados, programados, pensados. Cada passo, cada
levantar de braço, até o esboço de um sorriso é pensado, para ludibriar as
câmeras. Mas certamente elas me pegam desprevenido em alguns momentos. Se eu
suportasse a picada de insetos e o medo de animais carnívoros iria morar numa
floresta. Talvez ali seja o melhor lugar para se estar.
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Com Lázaro Ramos |
Cuscuzeiro - A melhor forma de viver?
Valdeck - Irresponsavelmente. Eu sempre
tive uma vida muito regrada, por falta de comida, de casa etc. Sempre tive que
lutar, acordar cedo, sair pra trabalhar e voltar tarde a noite, dormir, para no
dia seguinte continuar a penitência eterna. Em alguns momentos de liberdade eu
falei o que quis, fiz o que quis, aprontei irresponsabilidades. Não matei
ninguém, não usei drogas nem roubei nada de ninguém. Mas estes momentos em que
que não estava amarrado por regras me deixaram saudades. Qualquer hora dessas
vou sumir e aproveitar um pouco a vida, fora dessas leis e regras que só nos
deixam infelizes.
Cuscuzeiro - A maneira mais bela de morrer?
Valdeck - Na hora que a morte chegar
quero deixar muitos projetos pela metade. Não quero completar nada, passar anos
me lastimando, sofrendo, para fazer tudo certinho. Quero morrer dormindo ou de
morte instantânea. Morrer não faz diferença. O problema é sofrer, ficar
definhando, consciente, esperando a hora chegar. A forma mais bela de morrer é
não sentir dor nem remorso. Que seja rápida como um raio.
Cuscuzeiro - Há uma maneira correta de amar?
Valdeck - Amar corretamente? Amar é amar,
não tem explicação.
Cuscuzeiro - Por que escrever?
Valdeck - Para desabafar, vomitar no
papel ou na tela de um computador tudo o que não tenho coragem de vomitar na
cara das pessoas. Escrever é, também, uma forma de viver vidas paralelas,
fingir, mentir, revelar verdades, inventar coisas, pessoas, sentimentos. Viver
sem escrever – ou sem praticar outra arte – seria uma vida árida, vegetativa.
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Com o ator Luiz Miranda |
Cuscuzeiro - O que pensa do que os outros pensam sobre você?
Valdeck -Enquanto não me bater, não me
importo para o que pensam de mim. Se falam por debaixo do pano, se fazem
fofoca, comentam, falam mal, mas não me dizem diretamente, estão perdendo tempo
e se envenenando. Nunca perdi uma noite de sono imaginando o que pensam ou
falam de mim. Tenho coisas mais importantes para fazer.
Cuscuzeiro - O Valdeck diria de Valdeck?
Valdeck - Viva a sua vida e siga em
frente. Quem quiser que te acompanhe.