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quinta-feira, 1 de maio de 2014

Pirulitos de mel

Pablo Rios, Funcionário Público e Escritor

Não sei como devo começar esta crônica, embora falar de infância – sobretudo da minha – não me seja algo difícil, mas sempre que decido escrever, me vem este bloqueio que corta o fluxo de minhas ideias. Coisas que ocorrem a quem força a inspiração no anseio de escrever sobre algum saudosismo.
Saudade. Palavra sem tradução em muitas línguas, privilégio nosso que nos comunicamos através da “última flor do lácio, inculta e bela”, como disse o ilustre Geraldo Viramundo. Pois é justamente a saudade que me manda agora ao teclado no ensejo de buscar no bojo da memória uma recordação. Não foi difícil encontra-la. Outro dia, ao chegarmos na casa de minha sogra, Heloísa, minha filha, foi agraciada com um pirulito de mel. As lembranças vieram a cântaros.
A meninada de hoje encontra-se mergulhada em um mar de privilégios econômicos e desfruta de caramelos, pirulitos, balas, chocolates e outras guloseimas industrializadas, bem acessíveis e não menos prejudiciais. Em meu tempo infante não havia desses luxos para os mais carentes. Um chocolate de marca era um verdadeiro galardão, jujubas eram um privilégio, sonhos dos menos providos de economias. A inflação era um câncer na fazenda federal e um furo nos bolsos paternos e maternos.
Mas havia alternativas e uma delas me chegava aos ouvidos pelas janelas do lado da casa de Vó Anelzina. Era uma festa para a criançada da região da Praça da Matriz quando os pirulitos de mel de Maria de Fulô ficavam prontos. Corríamos aos borbotões e nos amontoávamos na porta da casa dela munidos de moedas. Coisa simples que levava o nome de pirulito de mel por mera pompa, já que a matéria prima do doce era calda de açúcar derretido, espetado em um palito de dente, enrolado em papel de embrulhar pão e enterrado na farinha para endurecer. Era de formato cônico, bastante pontudo fazendo-se perigoso nas mãos das crianças mais perversas.
Não tinham rótulos e nem eram anunciado na televisão, mas eram uma delícia, todo mundo gostava e pelo que percebi ainda gostam. Os pirulitos de mel são um dos poucos ícones culturais de minha terra que ainda resistem ao tempo e esquecimento. As crianças de hoje tal como as de ontem os apreciam, pois embora Maria de Fulô já não esteja entre nós, algumas senhoras ainda os produzem e como era vinte anos atrás, são vendidos rapidamente.

São simples doces, sem muito valor mercadológico, vendido a quinze centavos, mas hoje ainda, quando vejo uma criança com um pirulito de mel, sinto em minha boca o doce gosto da infância.

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