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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Manifesto contra o "SE"


Por Aretha Stephanie

Sabe aquela sensação de algo engasgado que quer sair, mas a gente não deixa? Segura o máximo que pode, até não conseguir mais? Pois é, estou assim.

Faz um tempo que quero dizer algo que está enganchado, me engasgando. E decidir que vou dizer, mesmo que seja por palavras escritas.
Mas, antes de tudo, não estou me escondendo atrás de uma tela. Ao contrário, decidi escrever sobre o assunto porque aqui, na rede, vai ficar para sempre e com certeza, vai alcançar mais pessoas do que eu acredito que precise saber. O que eu tenho pra dizer é algo que deve ser gritado para que não se repita. Não posso me calar diante do que aconteceu, não serei mais uma hipócrita em meio a tanta falta de verdade.
Confesso que esperei uma visita. Talvez uma visita não, já é pedir demais. Mas uma ligação por parte de meus "superiores" só pra perguntar se eu estava bem e acredito que não iria ferir a moral de ninguém, ao contrário, demonstraria preocupação com o que haviam me causado.
Por isso quero deixar tudo claro aqui, preto no branco (literalmente). E deixar-me à disposição para debates, é claro, mas não para ofensas. Afinal, o que eu direi aqui não é partidarismo e muito menos ato de politicagem. Estou deixando isso porque tem muita gente que acredita que a minha vida gira em torno de política ou de afrontar grupo A ou B e estão muito enganados. Longe disso, muito longe mesmo, afinal, em diversas ocasiões deixei claro a minha posição contra todo e qualquer tipo de politicagem. Sou uma pessoa política, sim, mas de forma alguma sou politiqueira e todos que são próximos a mim se já não perceberam isso deveriam prestar mais atenção.
Mas algo que não deve ser negado, é que nunca aconteceu algo como isto, ou estou errada? Não quero e não vou tentar apontar os culpados. Não vou citar nomes, e peço a todos que se quiserem comentar algo nesse post, também não o façam. principalmente porque não dá pra saber quem realmente tem culpa ou não nessa história toda.
Pensando bem, vou sim citar um nome. Alguém que também teve culpa, e no meu caso, foi a pessoa que teve a maior culpa: Eu, Aretha Stephanie, me coloco como culpada. Como minha mãe me disse quando cheguei em casa ( e acreditem, na maioria das vezes, mãe sempre tem razão) que eu não deveria ter ficado lá já que eu comecei a me sentir mal, que eu deveria ter saído na hora em que eu percebi que algo estava errado. E eis a minha parte na culpa, ter continuado lá quando comecei a sentir a minha garganta ser apertada por uma mão invisível, esse foi o meu primeiro sintoma. Não havia cheiro forte, não havia cheiro nenhum, o meu agressor ali era invisível e inodoro, por isso tão perigoso.
Sim, eu tenho asma. Mas essa não foi a causa do meu "ataque", foi talvez, a causa atenuante para que eu sentisse mais o efeito do veneno do que os meus colegas de trabalho e meus alunos. Só que isso também não tira a culpa de eu estar ali, trabalhando, em um ambiente hostil para mim, um lugar onde eu não deveria estar. Asma é uma doença crônica que deixa meus pulmões sensíveis, desde de criança eu fui cercada de privações e privilégios (posso dizer assim, certas "dispensas" das aulas de educação física é um exemplo). É uma doença controlável e minha crises são quase que agendadas, já que acontece mais em certos períodos do ano, ou seja, até certo ponto não me faz diferente de qualquer pessoa.
Mas o fato é que eu estava trabalhando em um lugar com produtos químicos perigosos, veneno! Ali tinha veneno! Perguntem a qualquer criança para que serve o veneno, qualquer pessoa, por mais idiota que seja, sabe pra que serve (e se não sabem, tratem de assistir a aula que Seu Madruga deu em Chaves). Veneno mata! esse é seu único objetivo, mas parece que algumas pessoas se esqueceram disso.
Ou se esqueceram, ou realmente (e infelizmente) colocaram o número de aulas dadas acima da saúde e do bem estar do professor e de seus alunos. Conversando com uma colega de trabalho, óbvio que não direi seu nome aqui, ela me disse que ao indagar uma pessoa responsável, que também não direi o nome, sobre o porque de ter aula no dia seguinte ao de ter colocado o veneno no colégio e a resposta foi (pasmem!) "Me disseram que era pra ter aula, e se alguém passasse mal liberava"............. entenderam? Entenderam mesmo? "se alguém passasse mal...". A única palavra que me vem à mente é COBAIAS. Havia menos de 24 horas que o prédio tinha sido pulverizado. Tinham crianças lá, funcionários, professores, gente! Eram pessoas que estavam lá! Mas não fomos tratados assim! Não fomos tratados como pessoas naquele lugar e é isso que eu quero que seja entendido! É sobre isso que eu procuro uma resposta que me faça entender o que estavam pensando! Sim, estou revoltada! E algo que eu ainda não tinha pensado é que não só o Colégio Municipal de São José tinha sido pulverizado, os outros prédios também. E conversando com outros pais e outros professores me caiu a ficha de que crianças menores e mais novas do que nossos alunos do Ensino Fundamental II também foram colocadas em risco de saúde, em risco de vida! Isso não é uma brincadeira! Isso não foi um simples teste de "se alguém passar mal libera as aulas"! Fizeram um teste com a minha vida, fizeram um teste com a vida dos funcionários e alunos. Brincaram com a vida dos filhos da nossa comunidade!
E, sinceramente, o que mais me angustia é todo esse silêncio. Ninguém, ninguém se posiciona e nem tenta explicar o porque dessa situação. Não dizem nada, nem contra ou a favor, não tentam se justificar ou se defender, e pior, não pedem desculpas pelos danos causados.
Dez dias se passaram e nada. Fiz um tratamento intensivo pra livrar meus pulmões de toda a química que o estava agredindo. E eu ainda posso dizer que tenho sorte. Sorte por ter um plano de saúde que me deu acesso ao que eu precisava, sorte por conseguir dividir o pagamento de todo o medicamento que eu precisei e ainda estou usando e vou continuar por mais alguns dias. Muita, muita sorte por ter ido dar aula apenas dois dias depois (na terça) à colocação do veneno no colégio, sabe por quê? Segundo o médico que me atendeu no plantão, vou usar as mesma palavras que ele me disse, eu " sabendo que tendo asma, não deveria estar naquele ambiente, e se eu tivesse ido no dia anterior ao que eu fui, dia seguinte à pulverização, teria tido uma chance menor que 10% de não ter uma parada respiratória ali onde eu estava". Parece forte pra vocês? Mais de uma pessoa poderia ter morrido nesse teste inconsequente do "se". "Se alguém passasse mal liberava as aulas", só "SE alguém passasse mal". Repito, mais de uma pessoa poderia ter morrido nessa brincadeira.
Por que mais de uma? Porque uma não "morreu", mas existe a possibilidade de uma ter sido impedida de nascer. Existe a possibilidade de uma mãe não poder ter seu filho nos braços em alguns meses por essa falta de responsabilidade, uma família magoada por isso. Se eu tenho certeza que foi por causa do veneno? Isso eu guardo pra mim. Talvez nunca se tenha a certeza se foi ou não por isso. Mas se existe a possibilidade, existe a dúvida, e sinceramente, essa dúvida é um peso a ser carregado pelo resto da vida. Isso me faz ter até pena de vocês.

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