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domingo, 23 de março de 2014

Carta Aberta aos Vereadores e à Comunidade de São José do Jacuípe – BA

General Garrastazú Médici, ditador, violento, assassino, vamos banir seu nome de nossa cidade

Saúdo aos nobres vereadores com votos de estima e consideração. Hoje vos escrevo na intenção de lembrar a todos de um tempo negro que assolou nosso país durante 21 anos. Me refiro ao regime militar, iniciado com um golpe que derrubou o Presidente João Goulart, datando 50 anos agora em 1 de abril.
Reconheço que a situação política de nosso país está passando por uma inversão de valores, onde a copa e imagem de salvadores da pátria é mais importante que a educação, que a saúde e a segurança. É por conta desses desmandos que um grupo de acéfalos está pedindo uma intervenção militar no Brasil. Para os que não sabem o que pode ocorrer caso essa estapafúrdia ideia tenha êxito, trago algumas lembranças do que é uma intervenção militar e algumas coisas que ocorreram quando houve a última.
Ao assumirem o poder em 1964, os militares cassaram os direitos políticos de muitas pessoas em nosso país. Perderam-se os direitos de fazer oposição e críticas ao governo. A arte passou a ser censurada, pessoas a serem interrogadas cada vez que davam suas opiniões. Com o passar dos anos, o regime militar endureceu sua mão de ferro e quem fazia oposição ou era suspeito de tal ato passou a ser expulso do país, exilados, impedidos de entrar em sua terra natal. Outros foram sequestrados e mortos. Muitos ainda estão desaparecidos quase trinta anos após o fim do regime. Pessoas eram presas e torturadas apenas por dizerem o que pensavam.
Todas essas monstruosidades foram acobertadas pelos políticos e perdoadas pela abominável lei da anistia, que absolvia todos os participantes das barbáries cometidas pelo regime militar. Essa loucura que adoeceu nosso país começou a enfraquecer quando o jornalista Vladimir Herzog foi enforcado na cadeia e o Governo Geisel espalhou a notícia de que ele havia se suicidado. Mentira! O povo descobriu e foi para as ruas cada vez mais pedindo o fim daqueles desmandos.
Tenho certeza de que quem lembra realmente como eram aqueles tempos não vai querer de volta uma chaga tão podre e fétida em nossa história. Mas existem pessoas que estão iludidas, pensando que a volta da ditadura militar seria a cura para a política doente que impera em nosso país. Vivemos dias de liberdade vigiada, onde abutres esperam nossas palavras para usá-las a fim de nos perseguir, sentimo-nos como se não tivéssemos o direito de ser oposição, de votar em quem queremos, mas não podemos deixar que tempos assim voltem em nível nacional.
Conquanto, nossa luta deve começar em nossa cidade, mostrando ao povo brasileiro que não somos a favor de nenhuma espécie de ditadura. Há em nossa sede municipal uma rua que tem o nome de um dos presidentes da ditadura militar. Rua Presidente Médici. Um homem que em seu governo ficou conhecido como o mais duro de todos, o que mais exilou, torturou e matou pessoas. Entre elas, a estudante Nilda Carvalho Cunha, que durante meses foi brutalmente torturada pelo governo Médici, e veio a falecer aos 17 anos em decorrência dos maus tratos que sofreu, sendo ainda ameaçada por seu torturador quando estava em seu leito de morte. Não podemos homenagear com uma rua um assassino, um sanguinário que cerceou vidas e feriu direitos humanos. Não podemos ter em nossa cidade uma lembrança de um tempo onde as pessoas eram escravas da vontade de governantes tiranos.
Minha petição é que os nobres vereadores mudem o nome da Rua Presidente Médici, e de qualquer outra do município que levem nomes da época negra do país, chamada ditadura militar. Não vos peço, na verdade imploro que retirem de nossa cidade essa lembrança maldita da ditadura militar.
Sem mais, apelo para suas consciências de legisladores livres: Por favor, deem-nos a sensação de liberdade das memórias negras que ainda existem no Brasil. Deus conceda a todos saúde e discernimento.
Atenciosamente,



Pablo Rios
Escritor



São José do Jacuípe – BA, 23 de março de 2014

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